Saturday, February 25, 2012

Adiós a la universidad: el eclipse de las humanidades, de Jordi Llovet

Pela primeira vez, vou dar estrelinhas (coraçõezinhos, cinco!) para um livro que ainda não li (a partir de uma crítica sui generis que o Sérgio fez). Dei-o de presente à minha irmã, no aniversário, e ela... leu! :) Leu e achou extraordinário. Extraordinário é mesmo que minha irmã leia um livro que ganha de mim, ou dos nossos pais: ela está sempre lendo livros que nem estão nas livrarias tradicionais, livros (não sei se ela usa essa expressão) de fora do sistema; panfletos, digo-lhe eu, brincando. Eu imaginei que o livro seria bom, pelo autor, pelo assunto, pelas frases na faixa da capa: "En un país normal, este libro provocaría un terremoto" (Xavier Antich), "Es una enjundiosa reflexión sobre la cultura y la educación superior de hoy. Su anecdotario, lleno de humor y perspicacia, es una auténtica delicia" (Fernando Savater). Jordi Llovet foi catedrático de Estética, de Crítica literária, de Teoria da literatura e de Literatura comparada, sempre na Universidade de Barcelona (UB); eu, da UPF (formado em Humanidades, ai!), não o conheci, conheço-o indiretamente, pelas recomendações de clássicos da literatura que ele faz cada quinta-feira no Quadern, caderno em catalão do El País. Ele é um dos maiores especialistas espanhóis em literatura clássica e catalã, além de tradutor ao catalão de Hölderlin, Kafka, Rilke, Musil, Thomas Mann, Flaubert, Baudelaire, etc. Mas deixou de ser professor.

Na contracapa do livro, explica-se o porque do título: em 2008, ele aceitou um plano de pré-aposentadoria pensado pelos chefões da UB, que ele não teria aceito "si las circunstancias de la vida académica que se explican en el libro no le hubieran invitado a tomar esa decisión".

Mais, da contracapa: "Durante todos estos años el autor ha vivido experiencias y momentos de una gran belleza, de aprovechamiento y de mucha dignidad, pero también ha vivido otras que caen de lleno en el malestar y la consternación, si no en el horror. El autor intenta que todas y cada una de las situaciones narradas vayan acompañadas de una reflexión pedagógica, política, pero también moral, para hacer de este libro algo útil para las generaciones presentes de estudiantes, profesores y directores de enseñanza secundaria y de las universidades de Cataluña y de toda España, y también para las generaciones de estudiantes de Humanidades -que el autor ya comienza a llorar- que vendrán". Pior: "En El eclipse de las humanidades se describe el sobrecogedor panorama del hundimiento de la cultura en España".

Vendo a empolgação de minha irmã com a leitura, quis comprar o livro para mim. Não o fiz. Em vez disso, comprei-o para o Sérgio, que, além de ator, é professor na Faculdade de Educação da UFRGS e se interessa muito por tudo aquilo relacionado com as formas, os métodos de e a qualidade do ensino. E agora ele não quer me emprestá-lo!!! Eu lhe disse que, se é tão bom, poderia doar o livro à biblioteca da FACED, mas ele, muito possessivo, respondeu: "Por favor! No doy este libro a ninguna biblioteca!, lo estimo demasiado como mío!". (Tudo bem, mas eu acho, Sérgio, que ele deveria estar nas bibliotecas das faculdades de Letras e Ciências sociais...) Não quer doar o livro à biblioteca, nem me emprestá-lo ("tu iria te deprimir"), e ao mesmo tempo me provoca dizendo que dorme e acorda lendo o Llovet.

Bom, depois deste preâmbulo, vai aqui sua crítica, a que fez com que eu não duvidasse na hora de dar ao livro todos os corações:

"Por fin miro el reloj: son las cinco. Agarro lo que no puedo dejar: el eclipse de las humanidades. Parte de mi desgarro se traduce con tanta precisión y con tan buen humor, a parte de la envidiosa vida y experiencia del autor, que no puedo dejar de leer. Como dijo algun Foix Moix o Comas Ribas, en un país serio ese libro sería un terremoto. Y me sirve. Me terremotea las ideas y las sensaciones. Agradecemos a Rosa, tu hermana, la lectura previa y a ti, por la elección. No podría haber llegado en mejor 'enhorabuena' este libro. Son las 07:19, tengo ganas de tomar un café". Em outro e-mail, ele escreve: "Olha que sincronia com o livro do Llovet: 'ADUFRGS abre o debate sobre o futuro da UFRGS: A ADUFRGS-Sindical, representante dos professores - responsáveis pelas atividades e fins da Universidade (ensino, pesquisa e extensão) e detentores de experiência e conhecimento para definir os objetivos da instituição e escolher seus dirigentes - conclama os filiados a uma profunda reflexão, tendo por base o nosso passado e o que queremos para o futuro da UFRGS, e a uma participação ativa nas discussões e elaboração de programas sobre o que queremos dos próximos gestores desta importante Instituição'". Por último, ele diz que talvez assista, como ouvinte (talvez eu também) à disciplina "Cinema, Literatura e Educação, é tudo verdade?", da professora Rosa Maria Bueno Fischer, "um primor de intelectual"... "tudo por culpa do Llovet, que não para de me incomodar: anda, sal de tu inercia, vete a estudiar".





PS: Este post é também sobre política (daí a etiqueta "Sobre política"). São os políticos os que estão acabando com as Humanidades: os que dirigem o país (no caso, Catalunya e España) e os que dirigem as universidades. Ou então é o mercado, que acredita não precisar de pessoas com esse tipo de formação. Mas são os polícos os que poderiam/deveriam resistir a essas "forças".

Wednesday, February 22, 2012

Ficar em albergue é tudo de bom... (ou sobre universidades e outras baixarias)

... E se o albergue é novinho e/ou charmoso, ainda mais - este HI de Porto Alegre é novo, abriu em dezembro. E se o albergue esta numa zona, no caso, numa rua de prostitutas e travestis, pode ser muito engraçado. (Nota: Conheci mais pessoas em quatro dias aqui, de Curitiba, BH, São Paulo,... do que em anos no apart-hotel da Demétrio.) Ontem foi noite de cerveja e bate-papo na calçada, na porta do albergue (não tem botecos na São Carlos, nem na Farrapos/Gaspar Martins, na Cristóvão estava tudo fechado): conversa sobre as universidades brasileiras, sobre a Europa afundando, sobre os travestis. Com destaque para um cara de Brasilia, colega de quarto, muito inteligente e engraçado. Primeiro, quando soube o que aconteceu comigo na seleção ao doutorado, deu-me uma lição de como funcionam as coisas nas universidades do país (ele trabalha na UnB; fala com as inflexões de voz e a rapidez de um Renato Russo mas com um timbre agudo, como de criança). Não disse quase nada que eu não soubesse pelas pessoas com quem já falei. Tipo: projeto inovador, não passa; projeto ousado, ambicioso, complexo, etc., não pode (ou também, por exemplo: se na UnB o candidato não fala em Darcy Ribeiro, se ferrou). Falou sobre como funcionam as pós-graduações, usando muitos palavrões; sobre o sistema universitário brasileiro (mais xingamentos), sobre os professores (maaais xingamentos). Disse que ele recomendava aos alunos que se mandassem para outros lugares, como o Canadá, onde "os estudantes que se destacam são recebidos de pernas abertas". E contou o caso de uma moça de Brasília que ficou dois anos preparando seu projeto de doutorado, não foi aceita e tentou se suicidar.
-Agora você chorou, mas já aprendeu.
-Não chorei, mas aprendi.
Depois o assunto foi a Grécia, o euro, a crise que pode acabar com a UE, e ele falou, assim me pareceu, com mais conhecimento do que os economistas que escrevem nas páginas cor salmão do El País.
Enquanto isso, outro colega que tomava cerveja conosco, de São Paulo, foi investigar os travestis. Voltou com a informação de que uma, a que rebolava mais perto de nós, era curitibana, veio a Porto Alegre para se operar e ficou ("cobra 50, deve ser uma rapidinha"). Então apareceu (entre muitos outros carros: a demanda é grande) um carrão (não vou descrever o carro: é que em Barcelona, ir à procura de prostitutas na rua, ou, pior, travestis, não é coisa que se faça abertamente; lá o cara teria usado boina, óculos de sol e bigode postiço; por isso achei o diálogo surpreendente, fiquei pasmo; "aqui é o Brasil!", explicou o brasiliense cabeça). O carro para à nossa frente, o homem assoma a cabeça (um homem bem vestido e penteado; pai de família?):
-É aqui a rua dos travecos?
-É, tudo reto. Tá vendo?
E ele:
-Cê indica alguma?
(Como Cê indica alguma? Pensei: ele está zoando de nós???)
-Cê acha que a gente experimentou todas?!? Hahaha!
Eeenfim. Ele dirigiu mais uns metros e parou ao lado da curitibana, não estava zoando, queria mesmo uma recomendação. Uns 45 minutos mais tarde, passou de novo, fazendo OK. Nós já estávamos rindo de outro assunto - o assunto não era para rir, mas o clima era de festa. É que um taxista parou, estava exausto, pediu uma cerveja no albergue: uma argentina, contou, acabava de ter um ataque epiléptico no táxi, "um horror".
-E ela não pagou.
-Pagou sim!
Uma hora depois, volta a passar o carrão (ó cara insaciável).
-O que ele quer é comer vocês - disse o brasiliense.
Subi ao quarto, li por meia hora, desci para fumar o último cigarro, encontrei ele cantando, sentado no meio-fio, com o paulistano de pé, como fazendo de guarda-costas.

Nota: Não contei sobre o tipo que também esteve no quarto, sarado, safado, professor de musculação (isto é inexato, não quero problemas). Ele foi no Sofazão (não conheço esses lugares, faço constar) e me disse feliz que pagou 100 e comeu três.

Nota 2: Esse HI não é para putanheiros, OK? Esses colegas de ontem, e outros, são mochileiros, estão fazendo turismo (sim, é possível) em Porto Alegre. A questão seria se sua localização é a mais adequada.


PS: Caetano:
"Três travestis
três colibris de raça
deixam o país
e enchem París de graça"

Monday, February 20, 2012

Carnaval 2012 na cidade fantasma

Diálogo por sms:

-Como está de carnaval? O meu está pacato mas relaxante.

-Meu carnaval está triste, mas estou aguentando o tranco.

-Aguenta firme, que já está acabando. Carnaval é sempre assim, por isso que fujo.

Friday, February 10, 2012

R. I. P.

Quarta-feira passada morreu em Buenos Aires Luis Alberto Spinetta. Eu nem sabia quem era, soube porque ontem apareceu um longo obituário em El País (de Espanha, não de Uruguai). A manchete diz assim: "Luis Alberto Spinetta, la poesía del rock argentino. Junto a los músicos Charly García y Fito Páez, puso las bases del género". No texto, Alejandro Rebossio conta que foi "el poeta más rockero o el rockero más poeta de Argentina", que "fue un autodidacta y le salió más que bien". Teve vários grupos: Almendra, Pescado Rabioso (com P. R. gravou o álbum Artaud, "considerado uno de los mejores del género"), Invisible, Banda Spinetta, Spinetta Jade. "Con Charly compuso el éxito 'Rezo por voz', y con Fito el álbum en que destaca 'Folies Bergere'". Depois de ler o obituário escutei no YouTube algumas das músicas citadas, "Muchacha (ojos de papel)", "Rutas argentinas", "Durazno sangrando", "A estos hombres tristes",... A que mais curti foi a primeira, que posto aqui. Não de início. De início me pareceu uma canção de amor como muitas outras, com uma letra mais ou menos comum. Mas não sei se pela melodia ou por sua voz, ficou em minha cabeça até que caí no sono. Pelos comentários que depois li no YouTube, Spinetta marcou a geração dos que foram jovens nos anos oitenta, e essa música em particular foi a trilha sonora de muitos primeiros amores, amores de adolescência, esses que com o tempo parecem totalmente esquecidos mas de um modo ou outro definem amores futuros.




Esta semana também faleceu, em Barcelona, Antoni Tàpies. Morreu na segunda-feira e os jornais seguem cheios de artigos sobre ele e sua obra. Era o pintor catalão mais universal, e eu só comecei a entender seu valor e curtir sua obra há poucos anos, depois de ver, na Fundació Tàpies, um documentário sensacional (não está online). Era um pintor difícil, muito influenciado pelas culturas orientais; "matérico", segundo sua própria definição; que tinha em Joan Miró seu mestre mas resolveu não usar cores primárias. Posto uma de minhas obras preferidas, "Armari", de 1973.


Wednesday, February 08, 2012

Sobre a crise

Queria ter escrito sobre a crise - econômica, mas não só - em Barcelona/Catalunha/Espanha/Europa há semanas; ter escrito sobre o que leio e o que vejo, mas estou sem tempo, ou nunca encontro o momento. A coisa está muito feia. O desemprego, na Espanha, é 23%, o desemprego juvenil 50% (simplesmente, não há trabalho, nem de garçom, nem de faxineiro/a), centenas de milhares de pessoas já deixarem de cobrar o seguro, famílias inteiras estão sem salário nenhum, tenho amigos desempregados, amigos que com trinta e tantos anos voltam a morar com os pais... Queria escrever, também, sobre os mendigos, que já não são os que sempre (tristemente) houve, agora são mais parecidos com qualquer vizinho de prédio. Há 8.000 pessoas sem teto em Barcelona. E cada dia, na cidade, 20 famílias são expulsas de suas casas (as tevês não usam essa palavra, nos noticiários se usam eufemismos: 20 "desnonaments", uma palavra catalã que eu nem conhecia, 20 "ejecuciones de hipoteca"). Não somente expulsas: muitas perdem a casa e, ainda, levam para a rua suas dívidas (nem a casa é suficiente para os "executores"). Os imigrantes estão indo embora, 300.000 foram embora de Catalunha em 2011. Tudo isso sem falar das pessoas com doenças graves que não podem ser operadas porque o governo corta despesas, fecha quirófanos, centros de assistência hospitalar, etc.

Não vou descrever em detalhe o que está acontecendo. Em vez disso, posto duas partes do programa "Salvados", do episódio dedicado à crise, emitido há uma semana. "Salvados" é um baita programa de humor fino e crítica social afiada, com Jordi Évole. A parte 3/4 é sobre o que os bancos fazem (usando a expressão do ex-banqueiro entrevistado, "pone los pelos de punta"). Na parte 4/4, o entrevistado é o professor Sampedro, que fala, entre outras coisas, sobre como os políticos estão usando o medo.






PS nada a ver (ou um pouco a ver, já que seu recém-lançado CD, La Orquesta del Titanic, trata da crise): Para quem esteja em Buenos Aires em março ou em abril, Serrat & Sabina tocam 18 dias (18!) no Luna Park. ("Yo no quiero un amor civilizado..." :)