Wednesday, September 19, 2012

Balada de otoño, de J. M. Serrat

Escrevo pouco aqui porque escrevo muito lá - no café dos velhos fumantes, meu romance.

Então, para manter o blog ativo, vai uma música que lembrei hoje de manhã, por causa da chuva.


Tuesday, September 11, 2012

Elis e Gal

Há umas duas semanas vi, em casa do Sérgio, esta gravação histórica pela primeira vez. Está num DVD que é uma joia, todo ele (esqueci o nome; Sérgio?). Dei-me conta de por que é quase unanimemente aceito que Elis Regina foi a melhor cantora do Brasil (demorei!), mas não só: fiquei impressionado com como ela sorri, brinca, gesticula, dança, olha para o Jobim, dá risada... Enfim, encantei-me com ela.

(O vídeo é sobretudo para os amigos espanhóis - os brasileiros devem tê-lo assistido dezenas de vezes.)




E logo tem a Gal Costa. (Para o Caetano, é ela a melhor voz do Brasil.) (Estou falando em "melhores", mas isso pouco importa, tem muitas vozes incríveis aqui, o motivo do post são meus... descobrimentos tardios.) Em dezembro passado, no Rio, quando fui comprar o novo CD da Gal, Recanto, a Bel me disse se conhecia ela bem. Eu disse meio envergonhado que "não muito", e a Bel me mostrou este outro vídeo, da música "Meu nome é Gal" (letra linda*): "veja o que ela faz com a voz, em duelo com a guitarra elétrica" (ou é um baixo?). Vídeo de 1981.




* (De Roberto Carlos e Erasmo Carlos)

Meu nome é Gal 
E desejo me corresponder 
Com um rapaz que seja o tal 
Meu nome é Gal 
E não faz mal 
Que ele não seja branco, não tenha cultura
De qualquer altura 
Eu amo igual 
Meu nome é Gal 
E tanto faz que ele tenha defeito 
Ou traga no peito 
Crença ou tradição
Meu nome é Gal 
E eu amo igual
Ah, meu nome é Gal


PS: Aqui sim: A Rolling Stone Brasil está fazendo uma enquete para escolher as maiores vozes do Brasil. Dá para votar:
http://www.rollingstone.com.br/enquete/maiores-vozes-do-brasil

Friday, September 07, 2012

Nêmesis, de Philip Roth

Quando li em algum lugar que o último livro de Philip Roth era sobre uma epidemia de poliomielite que, partindo de Newark, acabava com todo o mundo em Nova Jersey, incluindo todos os garotos de um summer camp, pensei iiih, esse não vou ler: já sei como começa, já sei como termina e, pior ainda, vai ser uma parábola (o que deu no Philip Roth?). Pensei demais. O romance (que finalmente li por recomendação do Leo, obrigado, um abraço :) não é uma parábola, nem é só sobre a epidemia (como La peste, de Camus, em que está inspirado, também não era). Roth conta, de maneira bem específica, como sempre, uma história concreta: a da epidemia como é vivida primeiro no pátio de uma escola em férias, onde garotos se reúnem cada dia para jogar beisebol, num bairro judeu e pobre de Newark, e depois numa colônia de verão nas montanhas, para onde conseguem escapar os garotos de famílias de classe média. Roth estabelece vínculos com outras duas grandes tragédias, a Segunda Guerra (o romance se passa em 1944) e, de maneira menos evidente, o extermínio dos índios norte-americanos, mas o foco está sempre na história local. E essa - isto é o que torna o livro fantástico para mim - é a história de um homem, mais uma personagem inesquecível na obra de Roth: o Sr. Cantor (acho que deveriam ter mudado o nome dele, Cantor em português não dá, demorei a me acostumar, o cara não canta), um jovem de 23 anos, o encarregado de cuidar e ensinar esportes aos garotos no pátio de Newark e na colônia de Indian Hills. Ele é o que mais importa neste livro, e o mais maravilhoso. À sua personalidade é dedicado o terceiro e último capítulo (para ler e reler); e, antes, é no seu sentido do dever, nas suas dúvidas (a maior, religiosa: Deus é um grande filho da puta?), seus insuportáveis dilemas e suas escolhas, no campo de sua moral, em definitiva, onde - não sei dizer em português - se corta el bacalao. Quem leu o romance não vai esquecer Bucky Cantor: "ele era para todos nós a autoridade mais reverenciada e mais exemplar que conhecíamos, um jovem com convicções, simpático, cortês, justo, zeloso, estável, gentil, vigoroso, muscular - ao mesmo tempo líder e companheiro" (p. 191); "entretanto, não há ninguém menos passível de ser salvo do que um sujeito bom destroçado" (p. 190).




PS nada a ver: Hoy es 7 de septiembre, día de recordar a Mecano. Acabo de pasar una hora en YouTube escuchando viejas canciones. Segunda mitad de los ochenta, yo era un adolescente. Qué recuerdos, cómo pasa el tiempo.

Saturday, September 01, 2012

Traduções ao português 17 (Contra Jaime Gil de Biedma, de Jaime Gil de Biedma)

De que serve, quisera eu saber, mudar de apartamento,
deixar atrás um porão mais negro
do que minha reputação —o que é dizer muito—,
pôr cortininhas brancas
e contratar empregada,
renunciar à vida de boêmio,
se logo vens tu, seu chato,
embaraçoso hóspede, burro vestido com meus ternos,
zangão de colmeia, inútil, desprezável,
com tuas mãos lavadas,
comer no meu prato e sujar minha casa?

Acompanham-te os balcões dos bares
últimos da noite, os cafetões, as floristas,
as ruas mortas da madrugada
e os elevadores de luz amarela,
quando chegas, embriagado,
e paras para te olhar no espelho
a cara destruída,
com olhos ainda violentos
que não queres fechar. E se te escarneço,
ris, me lembras do passado
e dizes que envelheço.

Poderia recordar-te que já não tens graça.
Que teu estilo casual e que teu desenfado
resultam truculentos
quando se tem mais de trinta anos,
e que teu encantador
sorriso de garoto sonolento
—certo de gostar— é um resto,
um intento patético.
Enquanto tu me olhas com teus olhos
de verdadeiro órfão, e me choras
e me prometes não voltar a fazê-lo.

Se não fosses tão puta!
E se eu soubesse, já faz tempo,
que tu és forte quando eu sou débil
e és débil quando eu me enfureço...
De teus retornos guardo uma impressão confusa
de pânico, de pena e descontento,
e a desesperança
e a impaciência e o ressentimento
de voltar a sofrer, mais uma vez,
a humilhação imperdoável
da excessiva intimidade.

A duras penas te levarei à cama,
como quem vai ao inferno
para dormir contigo.
Morrendo em cada passo de impotência,
esbarrando em móveis
às cegas, atravessaremos a casa
lerdamente abraçados, cambaleando
de álcool e de soluços reprimidos.
Oh ignóbil servidão de amar seres humanos,
e a mais ignóbil
que é amar a si mesmo!