Nota: Apaguei alguns trechos deste post porque tive a mais esclarecedora e linda conversa possível com a professora e coordenadora Ana Mello. Só sinto não tê-la tido meses atrás. Me refiro a uma segunda conversa, de hoje, dia 21. Na primeira, ontem, ela me disse, entre outras coisas, que meu projeto era "muito abrangente e requeria amplos conhecimentos de várias áreas". Como na letra de Tom Zé, parece que estejam me explicando para me confundir, me confundindo para me esclarecer. Algo assim devo estar fazendo eu, também, com quem lê o blog. Portanto, o assunto fica por aqui, não haverá mais posts - até porque não foi nada agradável escrever estes - e já vou escrever e-mails pessoais para explicar tudo um pouco melhor aos amigos e amigas.
Não costumo responder comentários anônimos - é esquisito não saber com quem se fala. Mas seu comentário ao post anterior, senhor ou senhora anonymous, pareceu-me inteligente, me fez pensar e achei que devia respondê-lo. (O outro comentário anônimo sei mais ou menos de quem é; não sei
exatamente, não sou bom para adivinhar essas coisas, mas seu autor ou autora deve estar entre três ou quatro pessoas muito queridas que conheço.)
Não sei se meu ego precisa ser "amansado", como você diz. Nem sei como ele está, se alto demais ou baixo demais. Ele oscila muito, hehe. E uma "perda" ou um fracasso como esse, assim como a frustração e a raiva, poderiam (espero que possam) me servir para ir em frente com mais força, sim.
Também não tenho grandes objetivos acadêmicos (não vou me tornar um PhD triste, pode deixar). Queria fazer o doutorado para ganhar uma bolsa integral (sim, confesso), já que, sendo estrangeiro, é difícil encontrar um trabalho para me sustentar no Brasil; queria fazê-lo para, no futuro, ser professor, poder passar meus conhecimentos de literatura, e minha paixão pela literatura, aos alunos; e queria realmente realizar meu projeto, quem me conhece sabe como chegou a me empolgar. Não quero me sentir nenhum "Super Acadêmico" (Deus me livre) e não tinha certeza de ficar entre os primeiros na seleção, mas tinha essa esperança, sim, achei que tinha chances: além de pelo próprio projeto, por minha boa colocação e minha nota média no mestrado e por ser o único candidato que o escritor e professor Assis Brasil, que se afastou um pouco da PUCRS ao se tornar secretário de Cultura, quis orientar, empolgado com o projeto também. Por tudo isso, não estar entre os doze aprovados me deixou triste e confuso (meu ego sobe e desce, mas não virei burro de um dia para o outro). Mais uma vez para não comprometer ninguém: um professor da faculdade me disse, no mestrado: "Teu lugar não é na PUC". Mas eu queria que fosse.
Para deixar você menos triste, querido anônimo: ontem tomei café com uma amiga francesa, formada em história da arte em Paris e casada com um catedrático que dá aulas na França há trinta anos e ela me disse: "Na França é exatamente igual". Essa coisa "triste" e "ridícula" não é exclusiva da academia brasileira, é uma característica da academia em geral, um mundo fechado, estanque, conservador, muitas vezes dominado por professores medianos e seu instinto de auto-preservação (isso vale para muitos outros "mundos", eu sei). Então, não: não pretendo ir para a USP ou para os Estados Unidos como me pareceu estar sugerindo esse alguém da PUC, nem voltar para a Europa. Além do que, gosto demais do Brasil.
Ubi bene ibi patria, diz o professor Assis.
Meu ego está "ferido", certo, pode-se dizer assim. Mas a ferida não é somente pessoal. Há um pouco de sangue quixotesco em minhas veias, no sentido de que gosto de "desfacer agravios, enderezar entuertos [y proteger doncellas :)]". Se as pessoas às que acontecem coisas como a que aconteceu agora comigo, ou que percebem como uma faculdade não é suficientemente boa, calam, como as coisas poderão melhorar? Havia alunos muito inteligentes no mestrado. Alguns colegas se indignavam tanto ou mais do que eu quando, por exemplo, uma professora dava aula sobre a vida de Nélida Piñon sem ter lido nunca um romance dela (é o único exemplo que darei, há muitos mais, pode acreditar). Alguns colegas se indignavam tanto ou mais do que eu quando alunos mais fracos (não culpados de nada, "they haven't had the advantages that you've had") apresentavam textos - textos que todos os outros alunos, supostamente, também tínhamos lido - limitando-se a ler trechos ou parafrasear, sem aportar nada de sua leitura pessoal, sem dar início a nenhuma discussão. Dos trabalhos destes vinte alunos, disse-me certa vez uma professora, só dois são publicáveis.
Nessa época do mestrado cheguei à conclusão de que deveria aguentar, ficar na minha, focar na dissertação. Afinal de contas, eu era (sou) formado numa boa universidade européia, eu era (sou) europeu; e como mais de um professor me disse, não devia exigir muito à universidade. Por que não? De novo: se ninguém exige mais, quando é que as coisas vão mudar? Mas depois soube que isso não era exato, eu não me sentia desapontado por ser europeu. Um bom amigo gaúcho, formado em filosofia na PUCRS, era muito mais crítico do que eu com respeito à sua faculdade, e uma amiga formada em psicologia também. Eles fizeram com que eu, o
europeu, o catalão da Faculdade de Letras, me sentisse mais legitimado para criticar minha faculdade
brasileira.
Se tivessem me dado a chance, eu teria gostado de fazer alguma coisa, não importa quão mínima, para que o nível da faculdade melhorasse. Acho que os alunos (os doze que foram aprovados para o doutorado, por exemplo) poderiam, deveriam fazê-lo. (Lembro-me agora de uma colega que estava triste porque sabia que escrevesse o que escrevesse, pesquisasse mais ou pesquisasse menos, teria sua dissertação aprovada: para que me puxar, dizia.) "O que acontece na PUCRS", você diz, anônimo, "é exatamente o que acontece em outras grandes universidades brasileiras e que a certa pessoa escreveu pra você. É triste. Mas é verdade, cara. Aliás, chega a ser ridículo". Mas a universidade vai se construindo, não tem porque permanecer como está, não tem porque ficar tudo igual.
Publiquem, diziam os professores mais graúdos nas reuniões dos alunos da pós-graduação: publiquem tudo, publiquem muito, qualquer coisa, e não esqueçam de colocar logo o que publicarem em seus currículos lattes. O objetivo era conseguir mais bolsas da Capes e do CNPq. Ao sair dessas reuniões, eu dizia aos amigos: mas por que "qualquer coisa", por que "muito"? O mais importante não é a qualidade do que se publica? Mais bolsas para fazer o quê?