Nêmesis se passa num verão dos anos 40 em que a cidade de Newark – e todo o estado de Nova Jersey, e outros estados – é assolada por uma epidemia de poliomielite. A personagem principal é Bucky Cantor, jovem professor de educação física. Ele é quem cuida dos garotos que jogam beisebol no pátio de uma escola, durante as férias. Vários desses garotos pegam a doença e são levados para hospitais, onde alguns morrem. Sobre os que vão para o hospital, os garotos do pátio não sabem nada com certeza. Somente que podem estar com o corpo meio ou totalmente paralisado ou serem colocados dentro de algo chamado "pulmão de aço". Esse "pulmão de aço" indefinido é o que os garotos mais temem, mais até do que ter o corpo imobilizado ou morrer. (Há outro fator angustiante no romance, outra indefinição: ninguém sabe, e o narrador não chega a contar, como a doença se transmite.)
Não sei se o Leo pesquisou o que era um pulmão de aço. O Sérgio e eu falamos sobre isso, mas não chegamos a saber exatamente o que era, nem o procuramos. Teria sido, fácil, na internet, mas imagino que estávamos empolgados demais com a leitura como para parar e pesquisar. Há uns dias eu soube, por acaso. Entrei numa livraria e dei de cara com um livro intitulado Pulmão de aço. Vi que o livro tinha fotografias, e lá estava ele. Entendi o porquê do terror dos garotos de Bucky Cantor. Não comprei o livro, talvez o compre, mas tirei uma foto (nunca fiz isso antes):
Também tirei uma foto da legenda dessa foto, que diz: "Hospital Rancho Los Amigos Respiratory Center, o maior centro de tratamento respiratório para casos de pólio do mundo na década de 1950, próximo a Los Angeles: pulmões de aço resultaram na criação das UTIs".
Essas crianças têm todo o corpo metido nesses cilindros e, dentro deles, estão imobilizados. É aterrorizador. E me espantou, porque mais do que uma ajuda parece um tormento, ver esses espelhos inclináveis que eles têm para ver seu próprio rosto, que é tudo o que podem fazer. O horror é indescriptível, a foto diz tudo.
Mais tarde, me perguntei por que o narrador de Nêmesis nunca descreve o que é o pulmão de aço. É proposital, demonstra o talento de Roth. O Sérgio e eu ficamos a nos perguntar, inquietos, o que podia ser aquilo que tanto medo dava aos garotos. Isso é o que o autor queria. E essa ignorância nossa tinha o seu paralelo no não saber dos próprios protagonistas, os garotos ainda não infectados que brincam no pátio da escola: eles "ouviram falar", sabem "mais ou menos", "algumas pessoas dizem" que os doentes ficam dentro de um "pulmão de aço", imobilizados, talvez para sempre. Mas não sabem exatamente o que é, de que se trata, daí o terror.
A história que conta o livro que não comprei, Pulmão de aço, de Eliana Zagui, também é terrível. Sinopse (copio do site da Cultura): "Eliana chegou ao Hospital das Clínicas de São Paulo aos dois [!] anos de idade, em 1976, com poliomielite, paralisada do pescoço aos pés e quase incapaz de respirar. Foi colocada no pulmão de aço, máquina usada para recuperar o aparelho respiratório, mas não apresentou evolução significativa. Os médicos avisaram aos pais da menina que ela teria pouco tempo de vida. Eliana ainda vive no hospital [36 anos depois!]. Em Pulmão de Aço ela conta como fez para sobreviver aos prognósticos e se tornar uma artista que pinta quadros com a boca". Na capa do livro, também o espelho, para mim apavorante.
5 comments:
Cruz credo in cruiz, sai prá lá, pulmão de aço. Prefiro as cordas de aço, do pinho, "o violão que os dedos meus acariciam..."
Ver
http://www.youtube.com/watch?v=xFsLDEkBXX0
Luis Melodia canta Cartol, "Cordas de aço".
boa viagem!
Ou este, na voz do autor, carioca bom de ouvir...
http://www.youtube.com/watch?v=16UsI_WVtJU
O próprio.
Lindíssima.
Obrigadão, Sérgio.
Roger,
Também não sabia o que era um pulmão de aço, e nem fui pesquisar.
Mas é um grande último livro pro Roth, mesmo.
Abs, Leo.
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