Sunday, January 31, 2010

Aquelas pequenas coisas

(Quinta-feira fui com a Anna para Capão Novo, convidado a passar uns dias na casa da praia onde mora a mãe dela. Sexta de tarde, chegaram uma irmã e o cunhado da Anna, e a Rafinha, sobrinha da Anna, filha de sua outra irmã. Rafinha, de três anos, é uma graça. Ficamos brincando com ela e todos os brinquedos que ela tem na casa da vovô.)

De noite, quando já tinha dado boas noites para todos e estava deitado, lendo um pouco, com apenas a luz da mesinha acesa, Rafinha bateu na porta. "Rutch, quero te dar um beijo de boa noite!", ela disse. Eu me ergui na cama, sorrindo. Ela, ainda hiper ativa passada a meia-noite, deu uns pulinhos até a cama, pulou em cima, pulou de novo para descer e veio até mim me dar um beijinho. Eu dei um beijinho nela. Então ela foi saindo e, antes de fechar a porta, com a mãozinha no interruptor, disse: "Tu quer que eu apague a luz para ti?".

(De manhã perguntei à Anna se foi ela quem lhe disse para o fazer. Ao contrário, foi a Rafinha que quis, a Anna lhe disse que eu já deveria estar dormindo.:)


PS:

Brincando de Pinote com a Rafinha.

Saturday, January 30, 2010

Salinger

Passei dois dias lindos na praia e só soube que Salinger havia morrido quando ouvi que falavam de O Apanhador no Campo de Centeio no Jornal Nacional. No dia seguinte, só li uma página na Zero Hora - escrevo sem ter lido ainda as matérias na New Yorker ou no New York Times. E já em Porto Alegre, hoje, li o e-mail que meu irmão Uri me escreveu logo que soube da notícia. Parece que esse livro faz parte do vínculo entre meus irmãos e eu, assim como entre os jovens de várias gerações. E acredito que isso possa se dizer de bem poucos livros...

Ele escreve o seguinte (em catalão; abaixo eu traduzo, desta vez sem censuras, respeitando os palavrões - puta, meu irmão não consegue escrever sem palavrão!):

"Ha mort el Salinger... què puc dir? No sé, ho acabo de veure i he pensat, li faré un mail al Roger, perquè, tot i que segur que ja el farà, crec que això es mereix un post. I és que, estimat germà, crec que El guardián entre el centeno va ser el primer llibre que em va fer entrar d'una manera diferent a la literatura. No sé com dir-ho, però recordo perfectament quan el vaig llegir, recordo perfectament que me'l vas recomanar i deixar tu i recordo perfectament que va ser el primer llibre que em va fer sentir different, somehow. Ara no faré un d'aquells mails de xupada de polla que molts esnobs que van de culturetes farien parlant del llibre i el geni i aquestes coses (segur que els diaris s'omplen de merda d'aquesta els propers dies!). És, simplement, que crec que va ser el primer llibre que em va marcar de veritat, va ser el primer Auster, el primer Murakami, el primer Tabucchi, el primer llibre, simplement, que em va començar a portar cap a la lectura com a alguna cosa més que un passatemps i també, suposo, el primer culpable que en aquesta mudança hagi omplert 15 caixes només amb llibres.

What can I say, el Rey ha muerto, viva el Rey. Ara que, ja que hi som, també et diré que t'ho pensis bé, perquè si el preu a pagar per escriure una obra mestra és tornar-se un pirat ermità, doncs... no sé què dir-te, potser és millor seguir disfrutant de la vida, els carnavals i les caipirinhas i deixar la literatura per quan tinguis 80 anys."

"Morreu o Salinger... o que eu posso dizer? Não sei, acabei de ver e pensei, vou escrever um mail para o Roger, porque, se bem que de certo ele já vai fazê-lo, acho que isso merece um post. Isto porque, querido irmão, acho que O apanhador... foi o primeiro livro que me fez entrar de uma maneira diferente na literatura. Não sei como dizer, mas lembro perfeitamente de quando o li, lembro perfeitamente de que tu foi quem me recomendou e emprestou o livro e lembro perfeitamente de que foi o primeiro livro que fez com que eu me sentisse different, somehow. Agora não vou escrever um desses e-mails chupada de pau que muitos esnobes que se fazem de culturetes fariam falando do livro e do gênio e essas coisas (de certo os jornais vão se encher destas merdas nos próximos dias!). É, simplesmente, que acho que foi o primeiro livro que me marcou de verdade, foi o primeiro Auster, o primeiro Murakami, o primeiro Tabucchi, o primeiro livro, simplesmente, que começou a me levar para a leitura como algo mais do que um passatempo e também, suponho, o primeiro culpado de que nesta mudança [Uri está se mudando] tenha enchido 15 caixas só com livros.

What can I say, el Rey ha muerto, viva el Rey. Agora bem, falando nisto, também vou te dizer que penses bem, porque se o preço a pagar para escrever uma obra mestra é virar um maluco ermitão, então... sei lá, talvez seja melhor continuar curtindo a vida, os carnavais e as caipirinhas e deixar a literatura para quando tenhas 80 anos."


Eu lembro perfeitamente bem de quando li esse livro. Foi no dia seguinte ao fim de meu primeiro namoro. O li do início ao fim e, quando terminei, voltei à página 1 e continuei lendo (foi uma dessas raras vezes em que a gente encontra o livro perfeito para o estado de ânimo - nessa hora eu estava, é claro, revoltado com o mundo). E lembro perfeitamente bem de quando Uri comprou o livro em inglês. Eu tinha lido a tradução e, depois, comprado o original na edição inglesa, de capa preta e vermelha; ele aproveitou uma viagem da família inteira a Nova York para comprar, na livraria Barnes & Noble de Columbus Circle, o "pacote Salinger" completo, seus quatro livros na edição americana, de capas brancas.

Quanto ao que Uri diz sobre os esnobes, eu discordo, eles não vão falar muito de O Apanhador..., não. Muito pelo contrário: a exemplo do que já fez L. A. Fisher na Zero Hora, vão destacar que preferem Nine Stories, que O Apanhador é bom para quem é jovem, etc. (Nada de estranho, eles são muito previsíveis.) E quanto à escrita de obras mestras, é uma brincadeira entre irmãos (eu digo, só, que se não consigo escrever um romance "muito bom", "a coisa" vai ficar na gaveta). Sobre o "maluco ermitão"... Faz todo o sentido que Salinger virasse um deles. É uma opção... razoável, até, na sociedade em que vivemos.

Associando idéias (que é o que eu estou fazendo, em vez de pensar): acho lógico que Salinger tenha ficado indignado com e impedido a publicação de uma espécie de continuação de O Apanhador... por um tal J. D. California (essa foi a última notícia que a gente teve de Salinger, antes de sua morte). Esse escritor quis usar a personagem Holden Caulfield para escrever um romance. E não importam todos esses papos sobre hipertextos, intertextualidades, pastiches e tal: não se tem direito a isso com a criação de quem, como diz meu irmão, entendia a literatura como... tudo menos um jogo.

Eu também adorei Nine Stories. Na faculdade, fiz um trabalho sobre "A Perfect Day for Bananafish", em forma de diálogo (diálogo real: conversamos sobre o conto) entre minha irmã e eu (no diálogo, ela, a mais nova, ajudava-me a entender o que acontecia na história, realista e poética ao mesmo tempo e meio críptica; o professor não gostou). Os contos são fantásticos, sim (li na Zero Hora que Hemingway foi o primeiro em reconhecer o talento de Salinger, quando leu um conto seu, antes deste ter publicado nada). Mas não por isso são melhores do que The Catcher in the Rye. Não lembro de nenhum outro romance, por exemplo, que, já no primeiro parágrafo, apresente uma voz (um narrador em 1a pessoa) tão forte e singular. Só me ocorre a comparação com a voz de Huck em Huckleberry Finn (que, também segundo Hemingway, é o livro que determina toda a literatura norte-americana posterior - curioso que os dois sejam livros para jovens e adultos).

Enfim. Se meu irmão não tivesse me escrito, eu teria feito um post comentando simplesmente a cena de O apanhador que me ficou gravada. É aquela em que, em Central Park, Holden senta num banco para contemplar a irmã, vê Phoebe, de 10 anos, girando no carrossel. Se lembro bem, é o único momento na história em que ele se sente feliz, ou, melhor, em paz com o mundo. Por causa dessa cena, por um tempinho eu chamei minha irmã de "Phoebe", ou "minha Phoebe".

E isso me faz lembrar de uma frase que anotei há muitos anos, de um outro grande que também morreu este mês (2010 começou mal para as artes...). No filme L'amour, l'après-midi, de Rohmer, a personagem Chloé diz assim: "Todas as pessoas são feias e vivem de maneira feia. As únicas que eu gosto de olhar como vivem são as crianças. Não importa se depois viram feias. Terão tido sua infância".

Wednesday, January 27, 2010

Aquelas pequenas coisas

Hoje, depois do almoço, sentei numa mesa na calçada, no meu café preferido da Rua da Praia. Na mesa à frente, de costas para mim, um homem de calça social, camisa azul-escuro por fora e chapéu terminava seu café com um amigo. Era um homem de bigode, sobrancelhas e cabelo brancos (para me poupar a descrição: tinha um parecido com Jorge Amado), de uns 65 anos. Quando a garçonete trouxe o meu, o homem me perguntou se "o senhor" (eu) pagava os cafés deles. Eu ri da brincadeira. E então, quando ele foi pagar, quis pagar o meu ("Tira o dele daqui", acho que ele disse, entregando a nota). Houve aquela troca de sins e nãos, mas ele insistiu tanto (a garçonete esperando, com a nota de 10 na mão) que no fim tive de aceitar. O homem pagou meu café e me desejou uma boa tarde.

(Pensei em meu avô, que era o tipo de homem dos que fazem essas coisas. E a garçonete, que me conhece, disse-me que ele era um cliente habitual, e que não era a primeira vez.)

Friday, January 22, 2010

Poemas no Ônibus (e Lula!)

Gostei deste simples "Poema no Ônibus", de Gabriela Cantergi.


Do coração

Sentou-se, no ônibus, ao lado
de um desconhecido
E foram felizes para sempre.


Ah! Antes de que eu esqueça! Adorei o editorial sobre o Lula que saiu hoje na Zero Hora! Por fim um jornal do Brasil falando muito bem dele! Os corresponsais no Brasil fazem isso sempre para os melhores jornais internacionais, mas acho em falta esse tipo de elogios nos jornais daqui!

... E a Folha, pelo que vejo, continua dando pau nele (sigh!). De maneira ridícula, aliás. Clovis Rossi, jornalista supostamente prestigioso, escreve, hoje: "Vejamos: quando candidato, Lula dizia que a economia brasileira teria que criar 10 milhões de empregos no período 2003-2007. Pois bem, o balanço ontem divulgado pelo Ministério do Trabalho mostra que, nos sete anos do governo Lula, foram criados 8,725 milhões de empregos. Ou seja, nem somando os dois mandatos de Lula terão sido criados os 10 milhões de empregos que o candidato dizia que..." Agggggh! Não sigo! É cada dia assim!!!!

Tuesday, January 19, 2010

A viagem definitiva* (Sputnik Sweetheart)

De novo no meu café preferido de Porto Alegre, reviso o que escrevi ontem no vôo São Paulo-POA.

Comecei este blog, em 2005, com uma "crônica" sobre minha primeira viagem de avião ao Brasil (na verdade, a segunda: a primeira foi em 2003; foi na segunda, porém, que eu vim para ficar). Não lembro se escrevi mais sobre essas viagens. Foram muitos BCN-POA, POA-BCN, BCN-RIO, BCN-SSA. Cada vez mais pesados e cansativos, psicologicamente mais longos. Mas esta última viagem merece de novo um post, já que foi ótima, tudo saiu "a pedir de boca", como se diz em espanhol. E isso apesar dela não ter começado bem. Em Madrid eu deveria ter ficado umas oito horas, o bastante para sair do aeroporto e passear, aproveitar o domingo. O problema é que o vôo de Barcelona atrasou, e assim foram para o ralo os meus planos de 1) ir ao Museu do Prado ver "Las Meninas", 2) ler tranqüilamente o jornal de domingo num café, 3) almoçar umas tapas no bairro de La Latina. Em vez disso, fiquei por quatro horas na pior, mais antiga terminal de Barajas (a T1), lendo os jornais e entrando, vez por outra, numa dessas desagradáveis celas de vidro para fumantes**.



Bom mesmo foi o vôo transatlântico com a TAM (para essa viagem, nada melhor do que a TAP ou a TAM; a evitar, Air France, B. A., Iberia e outras). Na poltrona, lado corredor, terminei o jornal e comecei o romance Sputnik Sweetheart (1999), de Haruki Murakami. Há anos que meu irmão Uri queria que eu lesse Murakami, e eu ia adiando a ocasião, com algum receio, não sei bem qual, ainda mais porque eu tinha adorado o único texto dele que eu li, "The Running Novelist", uma peça autobiográfica que saiu na revista The New Yorker. (Não está mais disponível no site, mas recomendo, é muito bom. E muito interessante para quem quer escrever mas sente falta da coragem necessária, a força, a temeridade de deixar de lado outros projetos, ou empregos, e se jogar na piscina; útil, também, para quem já escreve e encontra problemas práticos, do tipo falta de concentração, de ânimo ou confiança, etc.)

Embora Uri me recomendasse, dentre todos os livros de Murakami, especialmente Kafka On the Shore (apesar de ter achado todos eles bons), eu tinha comprado Sputnik Sweetheart, simplesmente porque aquele era longo demais: estou escrevendo em português e não queria mergulhar por tantas páginas no inglês (Murakami escreve em português: por preconceito, achei que a versão inglesa seria melhor do que a espanhola ou catalã). O romance, leve, triste, lindo, empolgou-me desde o início, e não vou esquecer tão rápido suas personagens, com as que me identifiquei. São três: a protagonista, uma garota japonesa de 22 anos chamada Sunire, solitária, excêntrica, leitora de Kerouac, escritora, ou futura escritora (grande personagem: por como age, como veste, como escreve, como se relaciona com o mundo***); o narrador e melhor amigo dela, cúmplice, soulmate dela, professor de escola em Tokyo, onde eles moram e a maior parte da história se passa; e Miu, mulher rica, misteriosa, importadora de vinhos da França, dezessete anos mais velha do que Sunire e de quem Sunire se apaixona. É para Miu que Sunire inventa o apelido Sputnik Sweetheart, quando, no primeiro encontro, a mulher, falando em Kerouac, chama ele de "um desses sputniks", em vez de beatnik. Não é uma anedota: as três personagens, essas três pessoas, têm amor para dar e receber e, no entanto, vivem isoladas, orbitando em solitário, como Laika no satélite desse nome. (Na colisão de dois desses "satélites" está o clímax do romance, que não vou contar.)

Parei de ler quando serviram a ceia, um frango delicioso com legumes. Depois, tomei dois rivotrils e dormi. Só acordei quando anunciaram o café da manhã, uma omelete que comi enquanto seguia com a leitura. Sunire havia desaparecido sem deixar rastro numa ilha do mar Egeu, e Miu chamava a Tokyo à procura da ajuda do narrador para encontrá-la. (É de destacar que cada personagem sofre uma metamorfose num ou outro momento; experimenta uma mudança em seu ser que Murakami descreve com uma mistura, para mim inédita, de fantasia e realismo.) Nem me dei conta e já estávamos em São Paulo, sem eu ter olhado para esse globo terrestre da telinha, com aquele aviãozinho que parece nunca se mexer. Nada disso, desta vez: nem mapa irritante, nem filmes ruins (não sei quais dava para ver, pois não liguei a tela): só uma boa leitura e uma boa dormida.

Não fui o primeiro em descer do avião, mas fui o primeiro em passar o controle de passaportes, o primeiro em chegar à esteira de bagagens; e minha mala, maravilha, a terceira em aparecer. Despachei-a rápido, comprei um guaraná (R$ 4,75, aeroporto é assim) e saí para fumar, com um parque que eu nunca tinha visto à minha frente, sentindo um cheiro de floresta (talvez não dê para ver o parque do 1º andar, o das saídas). E já antes de sair do saguão, tive a sensação (minha mãe não vai gostar) de estar em casa de novo. (OK, vamos dizer que eu tenho duas casas.) (Ou que uma parte de mim se encontra mais a vontade aqui, no Brasil.)

O vôo para Porto Alegre saiu sem atraso. Apenas tive tempo de comprar a revista Piauí de janeiro e de ler as manchetes nas capas dos jornais, que têm a virtude de trazer a gente de volta à @#(*! realidade. Piñera ganhou as eleições no Chile. Notícia péssima. Em 2003, estando em Santiago, li no jornal O Mercurio uma entrevista com esse cara. Ricaço, era a única esperança dos pinochetistas de voltar algum dia ao poder, e falava com fervor da Escola de Chicago, a dos economistas que nos levaram à crise atual. E Haiti. Não sei o que escrever sobre o Haiti. Acho que tantas mortes não são devidas ao terremoto. Como tantas mortes não foram devidas só ao tsunami; como não foram devidas só ao Katrina, que arrasou os bairros pobres de New Orleans. @#$% de mundo.

No vôo, li o maravilhoso último capítulo do romance, aparentemente sem relação com a história e, no entanto, seu encerramento perfeito: o diálogo do narrador com um de seus alunos, que vem de roubar uma besteira num supermercado, em que a criança não fala uma palavra sequer. Terminei o livro me sentindo definitivamente perto desses dois, o narrador e Sunire, e entendendo a amizade essencial entre eles. Tenho a sorte de ter uma amizade assim. Também sei o que é a solidão (curti-la, sofrê-la). Sei que as pessoas tristes são também, em determinados momentos, aquelas capazes de sentir uma felicidade maior. Uma gaúcha dessas tão belas, loira, alta e forte, dormia ao meu lado, com um livro subtitulado "Transforming Professional and Personal Life" no colo.


*Definitiva porque na próxima viagem a Barcelona, se tudo der certo, serei mestre em Teoria da Literatura e, mais importante, levarei embaixo do braço a primeira versão de um romance.

**Parei de fumar (de novo). Agora para valer (como sempre).

***Citação: "Sumire was a hopeless romantic, a bit set in her ways - innocent of the ways of the world, to put a nice spin on it. Start her talking and she'd go on nonstop, but if she was with someone she didn't get along with - most people in the world, in other words - she barely opened her mouth. She smoked too much, and you could count on her to lose her ticket every time she took the train. She'd get so engrossed in her thoughts at times she'd forget to eat, and she was as thin as one of those war orphans in an old Italian film - like a stick with eyes. I'd love to show you a photo of her but I don't have any. She hated having her photograph taken - no desire to leave behind for posterity a Portrait of the Artist as a Young (Wo)Man".


PS: Ótimo primeiro dia em Porto Alegre, também. Estive com a Anna brindando pelo seu cum laude no mestrado e seu ingresso no doutorado. E com o Pedro brindando pela sua mudança para o Rio. E com o João e o Leandro, amigos do Pedro e da Gabriela.

Monday, January 11, 2010

Quelle merde! :'( (Il nous reste qui, maintenant?)

Mort d'Eric Rohmer

Tem muitos filmes de Eric Rohmer entre os meus preferidos. Alguns deles, de há muitos anos, pois ele era (ou ele é!) o diretor de cinema preferido do meu pai. Mas vou postar aqui o trailer de um dos, mais ou menos, recentes. Eu amei Conte d'été. E achei incrível que alguém como Rohmer, que em 96 já tinha... 76 anos!, pudesse fazer - presentear a gente com - um filme tão singelo, tão leve, novo e cheio de vida.

Qui perd els origens perd (la) identitat

"Não sou brasileiro / Não sou estrangeiro / Eu não sou de nenhum lugar", canta Arnaldo Antunes. Sempre que volto a Barcelona ou a Porto Alegre, durante uma ou duas semanas me sinto assim, não pertencente a lugar nenhum. É um sentimento meio esquisito, e às vezes dá um pouco de medo, sobretudo ao pensar no longo prazo, no futuro.

(A Ana Kessler, também andarilha, me escreveu que não se sentir de nenhum lugar pode ser bom, equivaler a se sentir de qualquer lugar, de todos eles. Isso eu experimento se pego a mochila e vou para a estrada, mas nem tanto quando fico por seis meses no Brasil, por um em Barcelona, por outros seis no Brasil, etc. Dito de outro modo: ser um mochileiro tem tudo a ver com se sentir de todos os lugares, "do mundo"; porém, se instalar num lugar tendo nascido e crescido em outro, ou à inversa, voltar ao lugar onde a gente nasceu quando se está morando fora... não é sempre tão legal.)

Mas enfim: o que eu queria era comentar o verso de um poeta e músico (cantautor, a gente diz em catalão) bem famoso, Raimon. Um verso que por muitos anos tem sido (e continua sendo) repetido por políticos, personagens conhecidas e gente anônima que compartilham o mesmo sentimento nacionalista catalão. O verso diz: "qui perd els origens perd la identitat". Tradução (desnecessária, eu acho: como o catalão é fácil!): "quem perde as origens perde a identidade". O que acontece? Acontece que, sexta-feira passada, no programa de livros "L'hora del lector", da televisão pública catalã, o convidado foi o próprio Raimon. E em um momento da entrevista fez questão de corrigir esse verso que sempre lhe foi atribuído. Não porque não fosse dele, senão porque tem sido invariavelmente repetido com um pequeno erro; pequeno, ele disse, mas importante, porque muda o sentido da frase. O verso que ele escreveu é o seguinte: "qui perd els origens perd identitat" ("quem perde as origens perde identidade"). Ou seja, ele não escreveu o artigo "la". Quem perde as origens, ele disse no programa, não perde "a identidade": perde somente uma parte, porque a identidade não é feita exclusivamente do lugar (a cultura) de onde a pessoa é, onde a pessoa nasceu. A identidade é múltipla: construída por cada um de nós, imperceptivelmente, por meio das viagens feitas, dos lugares e das pessoas amadas, das experiências vividas, das línguas aprendidas, dos livros lidos, etc. (a lista seria muito longa).

Sendo assim - e no que me diz respeito -, Raimon, no programa, me deixou bem mais tranqüilo :p. Eu não perco a identidade por estar morando no Brasil, por falar e escrever em português, por fazer amigos num lugar a milhares de quilômetros de distância de Barcelona. Eu construo uma identidade nova. Sendo otimista, enriqueço-a. Não deixo de ser catalão, e, ao mesmo tempo, vou sendo muitas mais coisas.

Esta é a canção de Raimon, composta em 1975 (o "silêncio" é o silêncio dos muitos anos de ditadura franquista), com a tradução (literal). Raimon, valenciano, usa o catalão de València, diferente do catalão da Catalunya pelo sotaque e por alguns termos.



Eu venho de um silêncio

Eu venho de um silêncio
antigo e muito longo
de pessoas que se levantam
desde o fundo dos séculos,
de pessoas que são chamadas
de classes subalternas,
eu venho de um silêncio
antigo e muito longo.

Eu venho das praças
e das ruas cheias
de crianças que brincam
e velhos que esperam,
enquanto homens e mulheres
estão trabalhando
nas pequenas oficinas,
em casa ou no campo.

Eu venho de um silêncio
que não é resignado
de onde começa a horta
e termina o seco,
de esforço e blasfêmia
porque tudo vai mal:
quem perde as origens
perde identidade.

Eu venho de um silêncio
antigo e muito longo,
de pessoas sem místicos
nem grandes capitães,
que vivem e morrem
no anonimato,
que em frases solenes
nunca acreditaram.

Eu venho de uma luta
que é surda e constante,
eu venho de um silêncio
que a gente vai quebrar,
que agora quer ser livre
e que ama a vida,
que exige as coisas
que lhe foram negadas.

Eu venho de um silêncio
antigo e muito longo,
eu venho de um silêncio
que não é resignado,
eu venho de um silêncio
que a gente vai quebrar,
eu venho de uma luta
que é surda e constante.

Thursday, January 07, 2010

Barcelona, dezembro 09: 31 fotos



De esquerda a direita e de arriba a abaixo (cliquem nas imagens
que desejem para vê-las melhor): estação de bicing, Port Vell;
cachorro dormindo em banca de jornais, carrer Montcada; pintada
em porta, bairro de El Born; sopa de galets, prato típico do Natal.




Barcelona, cidade de bicicletas; Les Rambles; bar com exposição
de papiroflexia; Les Rambles (detalhe).



Bracafé (detalhe), carrer Casp; Casa Amatller, de Josep
Puig i Cadafalch; poema visual num prédio
do Eixample; vinícola da família.



CaixaFòrum (centro de arte contemporânea); outlet,
carrer Girona; Casa Calvet, de Antoni Gaudí;
Teatro Tívoli (detalhe).




Janela do 1º andar da Casa Batlló, de Antoni Gaudí; luzes natalinas,
carrer Aragó; banco do Park Güell (detalhe); bairro de Gràcia.



Poltronas de concreto na praia; paella em restaurante Escribà;
toalha (detalhe) em restaurante Escribà; MACBA (Museu de Arte
Contemporânea de Barcelona).




Marisco em banca do mercado de La Boqueria; novo contêiner de lixo;
perímetro da Barcelona romana (Barcino); cadeados na praia.



Praias de Barcelona; gambas;
O Touro Pensador, Rambla de Catalunya.


Fotos de Gabriela, Jonas, João, Oriol, Roger.

Monday, January 04, 2010

Mais uma vez

Há três anos assisti a um show da Vanessa da Mata em Porto Alegre, no auditório da UFRGS, e a música que mais me impactou foi a versão que ela fez de "Por enquanto", da Legião Urbana.

Agora li, no blog do Yuji, que com ele aconteceu algo parecido, no show do Frejat no SESC São Carlos, em maio passado. Yuji escreve (em catalão): "El moment que més em va fer flipar va ser, però, quan va interpretar 'Mais uma vez', de Legião Urbana (trobo que és el millor grup que hem tingut mai)".

Eis a versão: