Saturday, January 30, 2010

Salinger

Passei dois dias lindos na praia e só soube que Salinger havia morrido quando ouvi que falavam de O Apanhador no Campo de Centeio no Jornal Nacional. No dia seguinte, só li uma página na Zero Hora - escrevo sem ter lido ainda as matérias na New Yorker ou no New York Times. E já em Porto Alegre, hoje, li o e-mail que meu irmão Uri me escreveu logo que soube da notícia. Parece que esse livro faz parte do vínculo entre meus irmãos e eu, assim como entre os jovens de várias gerações. E acredito que isso possa se dizer de bem poucos livros...

Ele escreve o seguinte (em catalão; abaixo eu traduzo, desta vez sem censuras, respeitando os palavrões - puta, meu irmão não consegue escrever sem palavrão!):

"Ha mort el Salinger... què puc dir? No sé, ho acabo de veure i he pensat, li faré un mail al Roger, perquè, tot i que segur que ja el farà, crec que això es mereix un post. I és que, estimat germà, crec que El guardián entre el centeno va ser el primer llibre que em va fer entrar d'una manera diferent a la literatura. No sé com dir-ho, però recordo perfectament quan el vaig llegir, recordo perfectament que me'l vas recomanar i deixar tu i recordo perfectament que va ser el primer llibre que em va fer sentir different, somehow. Ara no faré un d'aquells mails de xupada de polla que molts esnobs que van de culturetes farien parlant del llibre i el geni i aquestes coses (segur que els diaris s'omplen de merda d'aquesta els propers dies!). És, simplement, que crec que va ser el primer llibre que em va marcar de veritat, va ser el primer Auster, el primer Murakami, el primer Tabucchi, el primer llibre, simplement, que em va començar a portar cap a la lectura com a alguna cosa més que un passatemps i també, suposo, el primer culpable que en aquesta mudança hagi omplert 15 caixes només amb llibres.

What can I say, el Rey ha muerto, viva el Rey. Ara que, ja que hi som, també et diré que t'ho pensis bé, perquè si el preu a pagar per escriure una obra mestra és tornar-se un pirat ermità, doncs... no sé què dir-te, potser és millor seguir disfrutant de la vida, els carnavals i les caipirinhas i deixar la literatura per quan tinguis 80 anys."

"Morreu o Salinger... o que eu posso dizer? Não sei, acabei de ver e pensei, vou escrever um mail para o Roger, porque, se bem que de certo ele já vai fazê-lo, acho que isso merece um post. Isto porque, querido irmão, acho que O apanhador... foi o primeiro livro que me fez entrar de uma maneira diferente na literatura. Não sei como dizer, mas lembro perfeitamente de quando o li, lembro perfeitamente de que tu foi quem me recomendou e emprestou o livro e lembro perfeitamente de que foi o primeiro livro que fez com que eu me sentisse different, somehow. Agora não vou escrever um desses e-mails chupada de pau que muitos esnobes que se fazem de culturetes fariam falando do livro e do gênio e essas coisas (de certo os jornais vão se encher destas merdas nos próximos dias!). É, simplesmente, que acho que foi o primeiro livro que me marcou de verdade, foi o primeiro Auster, o primeiro Murakami, o primeiro Tabucchi, o primeiro livro, simplesmente, que começou a me levar para a leitura como algo mais do que um passatempo e também, suponho, o primeiro culpado de que nesta mudança [Uri está se mudando] tenha enchido 15 caixas só com livros.

What can I say, el Rey ha muerto, viva el Rey. Agora bem, falando nisto, também vou te dizer que penses bem, porque se o preço a pagar para escrever uma obra mestra é virar um maluco ermitão, então... sei lá, talvez seja melhor continuar curtindo a vida, os carnavais e as caipirinhas e deixar a literatura para quando tenhas 80 anos."


Eu lembro perfeitamente bem de quando li esse livro. Foi no dia seguinte ao fim de meu primeiro namoro. O li do início ao fim e, quando terminei, voltei à página 1 e continuei lendo (foi uma dessas raras vezes em que a gente encontra o livro perfeito para o estado de ânimo - nessa hora eu estava, é claro, revoltado com o mundo). E lembro perfeitamente bem de quando Uri comprou o livro em inglês. Eu tinha lido a tradução e, depois, comprado o original na edição inglesa, de capa preta e vermelha; ele aproveitou uma viagem da família inteira a Nova York para comprar, na livraria Barnes & Noble de Columbus Circle, o "pacote Salinger" completo, seus quatro livros na edição americana, de capas brancas.

Quanto ao que Uri diz sobre os esnobes, eu discordo, eles não vão falar muito de O Apanhador..., não. Muito pelo contrário: a exemplo do que já fez L. A. Fisher na Zero Hora, vão destacar que preferem Nine Stories, que O Apanhador é bom para quem é jovem, etc. (Nada de estranho, eles são muito previsíveis.) E quanto à escrita de obras mestras, é uma brincadeira entre irmãos (eu digo, só, que se não consigo escrever um romance "muito bom", "a coisa" vai ficar na gaveta). Sobre o "maluco ermitão"... Faz todo o sentido que Salinger virasse um deles. É uma opção... razoável, até, na sociedade em que vivemos.

Associando idéias (que é o que eu estou fazendo, em vez de pensar): acho lógico que Salinger tenha ficado indignado com e impedido a publicação de uma espécie de continuação de O Apanhador... por um tal J. D. California (essa foi a última notícia que a gente teve de Salinger, antes de sua morte). Esse escritor quis usar a personagem Holden Caulfield para escrever um romance. E não importam todos esses papos sobre hipertextos, intertextualidades, pastiches e tal: não se tem direito a isso com a criação de quem, como diz meu irmão, entendia a literatura como... tudo menos um jogo.

Eu também adorei Nine Stories. Na faculdade, fiz um trabalho sobre "A Perfect Day for Bananafish", em forma de diálogo (diálogo real: conversamos sobre o conto) entre minha irmã e eu (no diálogo, ela, a mais nova, ajudava-me a entender o que acontecia na história, realista e poética ao mesmo tempo e meio críptica; o professor não gostou). Os contos são fantásticos, sim (li na Zero Hora que Hemingway foi o primeiro em reconhecer o talento de Salinger, quando leu um conto seu, antes deste ter publicado nada). Mas não por isso são melhores do que The Catcher in the Rye. Não lembro de nenhum outro romance, por exemplo, que, já no primeiro parágrafo, apresente uma voz (um narrador em 1a pessoa) tão forte e singular. Só me ocorre a comparação com a voz de Huck em Huckleberry Finn (que, também segundo Hemingway, é o livro que determina toda a literatura norte-americana posterior - curioso que os dois sejam livros para jovens e adultos).

Enfim. Se meu irmão não tivesse me escrito, eu teria feito um post comentando simplesmente a cena de O apanhador que me ficou gravada. É aquela em que, em Central Park, Holden senta num banco para contemplar a irmã, vê Phoebe, de 10 anos, girando no carrossel. Se lembro bem, é o único momento na história em que ele se sente feliz, ou, melhor, em paz com o mundo. Por causa dessa cena, por um tempinho eu chamei minha irmã de "Phoebe", ou "minha Phoebe".

E isso me faz lembrar de uma frase que anotei há muitos anos, de um outro grande que também morreu este mês (2010 começou mal para as artes...). No filme L'amour, l'après-midi, de Rohmer, a personagem Chloé diz assim: "Todas as pessoas são feias e vivem de maneira feia. As únicas que eu gosto de olhar como vivem são as crianças. Não importa se depois viram feias. Terão tido sua infância".

7 comments:

優次 (Yuji) said...

Jo, alienat com sóc, no me n'havia assabentat fins llegir el teu post. Quan tenia 11 anys, un amic em va recomanar "O Apanhador no Campo de Centeio". Em deia que segur que m'agradaria. Al llarg dels anys, més gent me'n va parlar, però no els vaig fer gaire cas. Fins que un dia, fa poc més d'un any, vaig trobar per accident "El Vigilant en el Camp de Sègol" a l'Amazon. D'ocasió sí, ple de puntes doblegades i pàgines engroguides, però va ser l'oportunitat de llegir per primera vegada alguna cosa en català, trencar un jejú literari de 7 anys i també pagar aquesta mena de deuda històrica amb mi mateix. Em va agradar molt. És clar que no hi estava d'acord en moltes coses, però en algunes situacions vaig trobar el jo d'uns quants anys enrere ;)

Roger said...

Yuji, deus ser l'únic entre milions de brasilers que ha llegit Salinger en català. Hauries de ser l'ambaixador de Catalunya al Brasil. O el representant o defensor de les llengües minoritàries (no perquè el català ho sigui, que ho és, sinó perquè també llegeixes en gallec, occità, etc.). Potser sí que és millor llegir El vigilant... quan s'és jove. Però això no seria un problema del llibre, sinó del lector adult, em sembla.

Ara estic llegint un "gekiga", el primer volum de Una vida errante, de Yoshihiro Tatsumi. El coneixes? M'està agradant. De moment, a la primera meitat, parla dels seus inicis com a dibuixant i de la seva admiració pel mestre Tezuka.

Una abraçada.

Sergio Lulkin said...

Nooooooooo, l´embaixador soc jo ja. No vaig llegir el Salinger en català, però si aixó fa part del examen, ho faré. I si no puc fer-ho, puc ser el vice-embaixador???? O el Consul à Porto Alegre?
Abraçada d´en Sergi

Roger said...

Ups! És veritat! Ho sento, Yuji. Un dia em vaig trobar el Jorge Furtado i el Sergio (que jo no sabia que era el Sergio) passejant per les Rambles de Barcelona. I vaig parlar amb el Sergio (que prefereix que li diguem Sergi). Parlava un català amb un accent excel·lent. Tant que, Rambles avall, vaig dir a l'amic que anava amb mi: "No ho sé, qui és. Deu ser un amic català del Jorge".

Però ens haurem de trobar tots, Sergi! Perquè l'accent del Yuji no es deu quedar curt, i també té una passió per Catalunya...

Em feu sentir malament. Potser ni m'acceptaríeu a l'ambaixada o consolat. O em posaríeu en una vitrina com a exemplar de català renegat... :o)

優次 (Yuji) said...

No em sona, jo normalment llegeixo manga normal. De fet, només estic tornant a tindre contacte amb coses de Japó aquests dies. Una altra mena de revolta, cabòries meves ;)
Home, si mai ens trobem et decebràs molt amb el xapurreig que parlo... I no et capfiquis tant que el que tens de català renegat jo tinc de brasiler renegat xD

Sergio Lulkin said...

Macos, nois! No ens barallem! Tindrem feina per tothom à L`ambaixada. Crec que el Senyor Reitor de la PUC ens podia ajudar... obrint un despatx al campus. Estic impresionat per la qualitat d´escrita catalana de l´Yuji, i tant que hem de fer una trobada. No conec brasilers més catalans que nosaltres dos! I si parla molt bé, hem de mantenir aixó, perqué m´encanta l´accent gironenc. Llavors, quins accents més he d´aprendre? Avui vaig de vacances à Floripa. Á la tornada ens posem en contacte, oi? Ara estic curiós per el treball d´en Cardús de diáleg platónic sobre el Peixos de Salinger...
Abraçade, Sergi Andreu Berenguer Tercer perqué soc hereu de familia real de Figueres.

優次 (Yuji) said...

El gironí és preciós, m'agrada també el taragoní, però de poble que conste, eh? Tot i que personalment m'agrada més el mallorquí. Pagès, d'aquells tan tancats que no s'entén ni un borall... Igual, l'accent tant és, ja en tindria prou amb que em parlessin en català, crec ;)
El meu accent és dolentíssim. No sé pronunciar la L catalana, i amb certs sons em costa moltíssim de pronunciar les Rs...