Saturday, December 01, 2012

Os pulmões de aço de Nêmesis

Este post é em especial para o Leo Wittgenstein Wittmann e para o Sérgio Berenguer Lulkin III. O Leo insistiu para que eu lesse Nêmesis e foi quem há pouco me disse que Philip Roth parou de escrever  Nêmesis é, portanto, o seu último romance; o Sérgio também leu o livro e com ele tentamos adivinhar o que era o "pulmão de aço", tão citado, mas nunca descrito, pelo narrador (quem é? ;).

Nêmesis se passa num verão dos anos 40 em que a cidade de Newark  e todo o estado de Nova Jersey, e outros estados  é assolada por uma epidemia de poliomielite. A personagem principal é Bucky Cantor, jovem professor de educação física. Ele é quem cuida dos garotos que jogam beisebol no pátio de uma escola, durante as férias. Vários desses garotos pegam a doença e são levados para hospitais, onde alguns morrem. Sobre os que vão para o hospital, os garotos do pátio não sabem nada com certeza. Somente que podem estar com o corpo meio ou totalmente paralisado ou serem colocados dentro de algo chamado "pulmão de aço". Esse "pulmão de aço" indefinido é o que os garotos mais temem, mais até do que ter o corpo imobilizado ou morrer. (Há outro fator angustiante no romance, outra indefinição: ninguém sabe, e o narrador não chega a contar, como a doença se transmite.)  

Não sei se o Leo pesquisou o que era um pulmão de aço. O Sérgio e eu falamos sobre isso, mas não chegamos a saber exatamente o que era, nem o procuramos. Teria sido, fácil, na internet, mas imagino que estávamos empolgados demais com a leitura como para parar e pesquisar. Há uns dias eu soube, por acaso. Entrei numa livraria e dei de cara com um livro intitulado Pulmão de aço. Vi que o livro tinha fotografias, e lá estava ele. Entendi o porquê do terror dos garotos de Bucky Cantor. Não comprei o livro, talvez o compre, mas tirei uma foto (nunca fiz isso antes): 

Também tirei uma foto da legenda dessa foto, que diz: "Hospital Rancho Los Amigos Respiratory Center, o maior centro de tratamento respiratório para casos de pólio do mundo na década de 1950, próximo a Los Angeles: pulmões de aço resultaram na criação das UTIs".

Essas crianças têm todo o corpo metido nesses cilindros e, dentro deles, estão imobilizados. É aterrorizador. E me espantou, porque mais do que uma ajuda parece um tormento, ver esses espelhos inclináveis que eles têm para ver seu próprio rosto, que é tudo o que podem fazer. O horror é indescriptível, a foto diz tudo.

Mais tarde, me perguntei por que o narrador de Nêmesis nunca descreve o que é o pulmão de aço. É proposital, demonstra o talento de Roth. O Sérgio e eu ficamos a nos perguntar, inquietos, o que podia ser aquilo que tanto medo dava aos garotos. Isso é o que o autor queria. E essa ignorância nossa tinha o seu paralelo no não saber dos próprios protagonistas, os garotos ainda não infectados que brincam no pátio da escola: eles "ouviram falar", sabem "mais ou menos", "algumas pessoas dizem" que os doentes ficam dentro de um "pulmão de aço", imobilizados, talvez para sempre. Mas não sabem exatamente o que é, de que se trata, daí o terror.

A história que conta o livro que não comprei, Pulmão de aço, de Eliana Zagui, também é terrível. Sinopse (copio do site da Cultura): "Eliana chegou ao Hospital das Clínicas de São Paulo aos dois [!] anos de idade, em 1976, com poliomielite, paralisada do pescoço aos pés e quase incapaz de respirar. Foi colocada no pulmão de aço, máquina usada para recuperar o aparelho respiratório, mas não apresentou evolução significativa. Os médicos avisaram aos pais da menina que ela teria pouco tempo de vida. Eliana ainda vive no hospital [36 anos depois!]. Em Pulmão de Aço ela conta como fez para sobreviver aos prognósticos e se tornar uma artista que pinta quadros com a boca". Na capa do livro, também o espelho, para mim apavorante.


5 comments:

Sergio Lulkin said...

Cruz credo in cruiz, sai prá lá, pulmão de aço. Prefiro as cordas de aço, do pinho, "o violão que os dedos meus acariciam..."

Sergio Lulkin said...

Ver
http://www.youtube.com/watch?v=xFsLDEkBXX0

Luis Melodia canta Cartol, "Cordas de aço".

boa viagem!

Sergio Lulkin said...

Ou este, na voz do autor, carioca bom de ouvir...

http://www.youtube.com/watch?v=16UsI_WVtJU

O próprio.

Roger said...

Lindíssima.

Obrigadão, Sérgio.

Leo Wittmann said...

Roger,

Também não sabia o que era um pulmão de aço, e nem fui pesquisar.

Mas é um grande último livro pro Roth, mesmo.

Abs, Leo.