Monday, January 12, 2009

De El País para vocês (Una universidad nueva, de José Ramón Alonso*)

No atual debate sobre a universidade fala-se pouco do que talvez seja o mais importante: o que estamos fazendo. O diálogo aberto com o professor, a discussão de casos, o trabalho em equipe, a investigação simples, a reflexão e a defesa pública de um tema são infelizmente mais exceção do que regra nas salas de aula universitárias. E quando acontecem maravilhamo-nos, docentes e estudantes, de quão divertido e interessante pode ser dar e receber aula.

O Espaço Europeu de Educação Superior é a oportunidade de, sem deixar de ter os conhecimentos imprescindíveis de cada disciplina, não dedicarmos todo o esforço a memorizar, e centrarmos no que um universitário necessita saber e saber fazer. Coisas assim:

Primeiro, deve saber ler. Parece insultante, mas é certo; deve saber ler e extrair as idéias principais de um texto, submeter a juízo crítico o que esse autor afirma, ser capaz de contrastar com outras fontes e chegar a conclusões próprias, pessoais.

Segundo, deve saber escrever; e não estou falando de não cometer erros ortográficos, nem de saber pôr letras juntas (isso deve ser dado por feito), senão de comunicar com claridade, com eficácia, com uma extensão equilibrada, com rigor no uso da informação, com a mente posta no leitor.

Terceiro, deve saber falar, falar a uma pessoa e falar a 100. Ser capaz de apresentar as idéias próprias e indagar as alheias. Conduzir e ganhar um debate. Respeitar os tempos e usar apoios efetivos. Não é fútil: saber falar bem considera-se o primeiro fator de sucesso na carreira profissional.

Quarto, deve ter disciplina. Realizar esforços continuados no tempo, fazer um programa e cumprir-lo; se comprometer e respeitar os compromissos. Ser leal com os colegas e consigo mesmo. E isso se aprende em sala de aula, mas também em um time de rugby ou no coro da universidade.

Quinto, deve ter uma visão internacional. Deve se expressar em inglês com soltura e ter certas habilidades em, ao menos, um outro idioma. Deve conhecer outros países como universitário, e isto implica ter uns conhecimentos básicos da política, a história, as aspirações, as fortalezas e as dificuldades desse país.

Sexto, deve ser criativo. No seu trabalho e na sua vida. Deve explorar a arte em qualquer de suas manifestações. Não só como espectador, também como autor; não ficar sempre na margem, passivo ou mero crítico do que os outros acometem; deve implicar-se.

Sétimo, deve conhecer as ferramentas próprias de sua disciplina, seja o método científico ou as grandes tradições culturais das Humanidades.

Oitavo, deve estar alfabetizado nas novas tecnologias. Chatear, mas também configurar uma conta de correio, usar uma folha de cálculo, construir uma base de dados e editar um texto, uma imagem e um vídeo.

Nono, deve ter uma cultura geral. Não pode ser que o estudante de História, frente a uma regra de três, ou o cálculo de uma percentagem, diga "Eu sou de Letras"; nem que o de Ciências não saiba quem foi Augusto.

Décimo, romper os decálogos, acabar com as tradições estúpidas, como os critérios de panelinha, com o que dirão e o não me importo.

Undécimo e último, deve ter uma visão ética. Em todas as épocas houve problemas e dilemas, perspectivas e limitações que deram a medida do ser humano de cada tempo e cada lugar. E isso não é diferente no século XXI, onde não há mais problemas locais nem soluções únicas. E isso é Espaço Europeu, e isso é Universidade.


*Reitor da Universidad de Salamanca


PS: Décimo segundo, ditado espanhol: "O que a natureza não dá, Salamanca não empresta".

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