Thursday, April 23, 2009

Hoje na Catalunha: Sant Jordi, dia do livro e da rosa

Vi agora no jornal que hoje é a pré-estreia do filme I Hate Valentine's Day em Porto Alegre. Não sei por que, porque hoje não é Valentine's Day. Eu nem sei quando é, Valentine's Day. Mas não é hoje. Achei simplesmente uma curiosa coincidência que esse filme, mais um filme americano estúpido? (este não é um comentário gratuito, tem a ver com o que vem depois), estreasse no "Dia dos Namorados" catalão. Porque hoje é Sant Jordi (São Jorge). Sant Jordi é o padroeiro da Catalunha, e o Dia (ou Diada) de Sant Jordi é o dia dos livros e as rosas... e dos namorados. Lá. (E em outros lugares da Espanha, onde copiaram isso; e inclusive em alguns lugares do Japão.) Acho que em todos estes anos eu nunca escrevi sobre Sant Jordi. Alguma vez a Gabriela me pediu que o fizesse, porque é um dia muito bonito e tal (por sinal, ela vai perder seu primeiro Sant Jordi; estará em Barcelona para ver o Fito Páez... mas só no sábado). Bom, nesse dia os homens dão rosas às mulheres amadas, e as mulheres dão livros aos homens amados. Só que, nos últimos anos, todo o mundo dá flores e livros a todo o mundo. É mais politicamente correto. Ou seja, mulher ganha livro também. E cada vez tem mais homens ganhando rosas. E não é somente a amada que ganha uma rosa: qualquer mulher ganha: a irmã, a mãe, a avó. Tudo bem, irmã, mãe e avó não são "qualquer mulher". Mas é que também ganha rosa a chefe, a(s) colega(s) do trabalho, a irmã da namorada, as amigas, claro, etc. E elas ficam felizes da vida. (Eu não teria mudado isso de rosa só para rosa + livro; mulher gosta mais de flor; e sempre no Sant Jordi me lembro dos versos de Dorothy Parker em que ela se queixa de não ganhar nunca uma limousine e ganhar sempre uma "perfect rose": mentirosa, certo que ela prefere a "rose", tem mais classe.) Mas o mais bonito é como fica Barcelona, cheia de bancas de livros e rosas, não dá nem para caminhar. E isso não só no centro: a cidade toda é inundada de bancas de rosas e livros: você sai de casa, e lá tem alguém oferecendo rosas a 5 euros. A cidade fica linda, não estou brincando: com rosas e livros em todas as ruas, imagina!, deveria ser todo o ano. Mas tem gente, especialmente garotas, que não gostam desse dia, claro; como, provavelmente, a protagonista desse filme americano. Porque ficam passeando e passeando, e cada vez é mais tarde e ainda não ganharam uma rosa. E o dia termina com elas chegando em casa e ganhando uma rosa do pai. Eu nunca dei uma rosa à minha namorada nesse dia. Não que eu lembre. Porque eu não tinha namorada, ou porque eu não estava na cidade, ou porque eu tinha namorada, mas a gente tinha brigado. Dei rosas a amigas, mãe, avó (acho que irmã não, porque não fez por merecer),... Só nunca fui o bobalhão que chegava no trabalho com vinte e tantas rosas, uma para cada colega. Hoje lembrei de meu melhor Sant Jordi. Eu tinha uns 12 anos. Uma menina, Laura, gostava de mim, ou isso diziam meus amigos, e ela esperava por minha rosa. Meus amigos me empurravam para que eu desse uma rosa a Laura. E ela estava num canto do pátio enorme da escola, com suas amigas, que depois a deixaram sozinha (tadinha), talvez para que eu não tivesse vergonha de me aproximar. Eu me lembro dela lá sentada, e acho que eu tinha uma rosa na mão (meus amigos tinham colocado ela ali). Mas sabe que não lembro se lhe dei a rosa? Isso sumiu de minha memória. Talvez o fiz, talvez não; talvez o fiz por meio de uma outra pessoa. Lembro de um beijo na bochecha que ela teria me dado. Então eu o teria feito. Mas pode ser uma lembrança fabricada. Tempo depois, Laura casou com um colega meu desses anos de criança, colega de aula. Um cara que..., bom, deixa pra lá. E eu fui achando ela nos lugares mais insuspeitados, ao longo dos anos. Sempre com ele. Em uma passeata depois que a ETA assassinara um escritor (tudo bem, tinha muita gente lá, um milhão de pessoas; mas... curioso, não é, ir encontrar ela?); em Marrakech; em Nova York. Eu sempre pensando: será que ainda está com ele? Pois sim, estava. Essa é a história. Nenhum pesar, claro. Não ia ficar namorando aos 12 anos! Agora, os livros. Os livros que se vendem no dia de hoje são uma porcaria. (Mais tarde vai sair a lista dos mais vendidos de hoje e eu vou adicioná-la aqui.*) Porque, nos últimos anos, quem vende mais é qualquer coisa menos escritor. Na Catalunha temos nossas Oprahs, Martha Stewarts, David Lettermans. Esses vendem muito, aproveitam o dia de hoje para lançar qualquer coisa que tenham escrito. Temos cozinheiros, também. Depois, famosos que ninguém sabe por que o são. Políticos. Jogadores do Bar$elona que nem sabem escrever (um dia vou ter de investigar esse fenômeno: por que os jogadores de futebol não sabem escrever - às vezes, nem falar - e os de basquete sim). Depois tem, também, os escritores de livros de Sant Jordi: ou seja: aqueles que alguns meses antes recebem o encargo da editora de escrever um romance, algumas semanas antes "ganham" um prêmio e no Dia D têm seu livro lançado com grande estardalhaço. Resultado de tudo isso: boa literatura, só nas livrarias: não vai ter livros bons nas bancas. Isso é desmoralizador: vende-se porcaria e compra-se porcaria. Esses escritores de um dia (showmen et al.) se defendem dizendo que, se bem impedem que livros de bons escritores sejam comprados no dia, a leitura de seus livros leva pessoas que nunca lêem a comprar melhores livros depois. Bullshit. Três vezes bullshit. Quem lê Martha Stewart fica sempre por aí. E o que esses aproveitadores fazem é ainda pior. Porque, na Catalunha, no dia de hoje as editoras faturam o 50% do total anual. Como o escritor de verdade, isto é, aquele que passa cinco anos burilando um romance, vai se sentir? Ele (ou ela) fica sorrindo, no cantinho de uma banca, tentando vender seus 20 exemplares. Fazer o quê? E o que dizer de um país que tem bastante com um único dia para comprar/vender a metade dos livros lidos (se lidos) no ano? A imagem acima é de Raquel Marín, ilustradora, que dá parabéns aos colegas no Día del Libro (vou falar dela em um post próximo :) Não sei por que a flor não é uma rosa; talvez achou que fosse muito óbvio. Bom, na Espanha é o Dia do Livro e só, não tem rosa nem namorados; é o dia do livro porque em 23 de abril morreu Cervantes.


*O jornal La Vanguardia diz assim: "O falecido Stieg Larsson, com as duas primeiras obras de sua trilogia Millenium [não é com dois 'n'?] e Javier Cercas, com sua análise do 23-F [golpe de Estado fracassado na Espanha], se converteram nos autores 'vencedores' [= mais vendidos] do Sant Jordi deste ano. [Não posso opinar, nunca li. O primeiro é best-seller também no Brasil.] Os títulos de Larsson são [curiosos]: Los hombres que no amaban a las mujeres [Os gays?] e La chica que soñaba con una cerilla y un bidón de gasolina [A pirómana?]. O primeiro romance lidera as vendas de livros de ficção tanto em catalão quanto em espanhol [Catalunya is (not that) different]. No mesmo apartado, destacam El silenci, de Gaspar Hernàndez [não conheço] e L'últim home que parlava català [para o prazer masoquista do leitor nacionalista; o autor é o embaixador espanhol em Londres], em catalão, e La soledad de los números primos, de Paulo Giordano [não conheço], em espanhol. Depois de Javier Cercas, que, com o ensaio romanceado Anatomía de un instante, foi quem mais livros autografou [um ensaio em primeiro lugar?, peraí, não pode; ah, é que tem fofoca, fala mal do Rei], em não ficção os mais vendidos foram La crisis Ninja, de Leopoldo Abadía [economista (aparece muito na TV?; não sei)], e Todos mis hermanos, de Manel Estiarte [ex-jogador de waterpolo]. Em catalão e não ficção, Crònica de la independència [mais nacionalismo (vende muito); mas esse livro não deveria estar em ficção? Quero dizer, a independência não foi, né?, se foi ninguém me avisou], de Patrícia Gabancho, El món sobre rodes, de Albert Casals [?], e No m'ho crec, de Joan Majó [um ex-ministro de não sei qual governo]. Entre os mediáticos, cabe destacar o livro do programa Crackòvia [programa humorístico de TV sobre futebol, acho; esse nem tem autor], Guardiola, de Jaume Collell [Guardiola é o atual treinador do F. C. Bar$elona], e La pilota no entra per atzar, de Ferran Soriano [ex-diretivo do mesmo clube de futebol; o Macaco Simão gostaria do título: 'A bola não entra por acaso'. Claro, tem de empurrar]".

2 comments:

優次 (Yuji) said...

Si en tigués, de xicota catalana, jo encantat de guanyar-me un llibre en català, sí senyor! xD
Tot i que si no fos catalana, potser li donés una rosa perquè sí... Sona a frikada, però hi ha moltes dates que m'agradaria importar d'altres països... És divertit, no sé. D'Espanya, per exemple, ja he incorporat el Dia dels Innocents, que, per cert, és el meu aniversari. xD

Roger said...

El 28 de desembre? M'ho apunto!