Thursday, April 09, 2009

O hino brasileiro é de quem? Arnaldo Antunes sobre São Paulo

Este é aquele post sobre A. Antunes e S. Paulo que ia escrever. (Aviso que vai sobrar para o Rio, para Porto Alegre e para Barcelona.) O Yuji "me lembrou" que devia escrevê-lo com seu comentário ao post anterior, com sua vontade de morar no estrangeiro. E a Maitê Proença (atriz, para quem não saiba), ontem, fazendo o ridículo no programa Saia Justa, me lembrou também. A Maitê não gostou que um francês lhe dissesse que os brasileiros costumavam esquecer um semi-tom ao cantar o hino do Brasil. Um francês, imagina! Um estrangeiro falando isso para uma autêntica brasileira! Ela gritou no programa, dirigindo-se à câmera: "O hino é nosso, viu? E nós cantamos o nosso hino como nós queremos. Seu besta!". É assim que reagem alguns brasileiros às críticas de estrangeiros a seu país e suas cidades. (Estrangeiro que visitas o Rio de Janeiro: não perguntes a um carioca sobre desigualdade social, violência, etc.) Não é tão grave, isso da Maitê. Ela é, simplesmente, nacionalista dos pés à cabeça. Mas esse tipo de reação desanima muito aos que não nos sentimos de país nenhum - e, muito menos, nacionalistas. (A Maitê provavelmente já cantou também, feliz da vida, aquela música famosa do John Lennon - e muitas outras parecidas: Caetano Veloso, "eu não tenho pátria..." -, mas não reparou na letra...) Desanima tanto quanto desanima aos não crentes ouvir o Papa falando besteiras na África (ver post antigo). E só para responder à Maitê: o hino brasileiro, para mim, é de quem o compôs, de quem escreveu a letra, de quem o quiser cantar ou tocar, de quem gostar dele, de quem o sentir seu - brasileiro ou não.

Arnaldo Antunes confirmou, no diálogo ao que assisti na UFRGS, aquilo que C. Calligaris escreveu uma vez na Folha de S. Paulo (de novo cito de memória): "S. Paulo é uma das cidades menos provincianas onde eu morei; menos provinciana inclusive do que Nova York". Ao ser perguntado pelo que havia de São Paulo em sua música (nota: não foi dele a vontade de falar de sua cidade), A. Antunes disse que São Paulo era uma cidade "mutante", e que ser de São Paulo era como não ser de nenhum lugar; não se sentir paulistano, ou brasileiro, senão meio apátrida, estrangeiro na própria terra, desenraizado. Dá para perceber esse sentimento em muitas de suas letras: "A nossa casa é onde a gente está / A nossa casa é em todo lugar"; ou: "Eu não sou da sua rua, / Não sou seu vizinho. / Eu moro muito longe, sozinho. / Estou aqui de passagem".* O bairrismo, entretanto, como era de se esperar, apareceu na platéia, quando alguns assistentes quiseram saber quais bandas gaúchas o Arnaldo conhecia e gostava. E o "amor à terrinha" apareceu também na voz do entrevistador, L. A. Fischer, que fez questão de falar do Beira-Rio e do Internacional. (Arnaldo, educado, sorria e respondia.) Porto Alegre (falando assim, grosso modo) é uma cidade provinciana. O Rio também (não há dia que o jornal O Globo não inclua auto-elogios à cidade de vários de seus colunistas, o que não ocorre na Folha ou no Estado de S. Paulo). E a cidade onde eu nasci, Barcelona, também (vocês não imaginam com que pouco sentido do ridículo as pessoas - e a mídia - manifestaram seu orgulho quando o "grande Woody Allen" resolveu fazer um filme lá). Gente: já é bastante difícil viver sem a ajuda de ser crente ou nacionalista (sem essas "paranóias coletivas", segundo Freud); então, por favor, poupem-nos ao menos desses momentos de constrangimento. (Mas sei, sei que ninguém vai nos poupar, e que devemos aceitá-los, e até entendê-los...)


*A manifestação mais radical, que eu já traduzi uma vez, está em uma música escrita por ele na época dos Titâs: "Não sou brasileiro / Não sou de lugar nenhum / Não sou de São Paulo / Não sou japonês / Não sou carioca / Não sou português / Não sou de Brasília / Nenhuma pátria me pariu / Eu não tô nem aí / Eu não tô nem aqui".

11 comments:

Marinella said...

Roger, é próprio do ser humano: se não limpamos os vidros da janela ou deixamos de recolher a roupa suja, preferimos que o visitante nos compreenda e não que nos aponte o erro. Seria descortesia da sua parte...

:-)

Roger said...

Uma boa amiga minha do Rio usou uma vez a mesma metáfora...

A diferença, para mim, é que tua casa é propriedade tua, e as cidades e países não são propriedade de ninguém. (Mas sei que o nacionalista vai dizer: "Brasil é dos brasileiros", "Espanha é dos espanhóis",...)

Na verdade não gosto de escrever sobre nacionalismos, minha primeira intenção era contar só o que Arnaldo achava de São Paulo, uma cidade onde eu acho que eu poderia viver (se não fosse pelos engarrafamentos :)

Marinella said...

pois é, eu ia complementar meu comentário aqui dizendo que, talvez, descortesia maior seja fazermos de conta que está tudo bem quando está tudo errado, but...

de fato, Porto Alegre pode ser provinciana, mas o ar ainda é um pouquinho melhor (sabia que SOMOS a cidade mais arborizada do país??? hein? hein? ;) e os engarrafamentos menores.

bjos

Roger said...

hehe! :)

Eu gosto de Porto Alegre. Só me falta o mar. Que também falta em São Paulo...

Beijo!

優次 (Yuji) said...

É Maitê, às vezes as críticas doem! ;)

Una cosa que no hi té res a veure, però alhora hi té: he viscut tota la meva vida a São Paulo. D'alguna manera, quan pensava en l'estat de São Paulo, pensava en la capital i L'INTERIOR, per molt que no intencionalment, amb un cert menyspreu semblant al que "gent de ciutat" es refereix al poble, o de separar "Paris" i "la province". Aquest any i poc a São Carlos convivent amb gent de diferents llocs em va fer perdre una mica aquest..no sé, digui-li com vulguis, jo li diria "aire de superioritat"...

El que potser sempre m'ha cridat l'atenció a Catalunya és que, tot i estar políticament dins Espanya, hi ha gent que se sent catalana, i que vol que el seu país segueixi sent-ho. Potser no és més que un sentiment motivat per les circumstàncies, però (ja t'ho he dit) jo flipo, per a mi és un sentiment que sí que arriba a ser-ne, de bonic. Bonic, no fos l'odi i l'anti-espanyolisme que porta a dins incrustat i disfressat. Hom no pot viure plenament com a català a BCN, però suposo que hi pot viure perfectament com a espanyol. Com que no hi he estat mai, no sé si dic algun absurd, però imagino que sense el nacionalisme, Catalunya no existiria de la mateixa manera que existeix...

Roger said...

Però encara existeix l'interior de São Paulo? No és tot capital, ja? :p

Sí que hi deu haver aquest menyspreu de la gent de la ciutat envers la gent del camp... Passa a molts llocs (a Barcelona...), i París és el gran exemple, com tu dius. Però saps que a Nova York no he notat? Si passa també a São Paulo, és una llàstima... És difícil no sentir-se superior a la gran ciutat, perquè la gran ciutat té molts atractius. Però suposo que, com tu també dius, conèixer els atractius de l'interior ens baixaria els fums.

No sé si és bonic estimar el teu país. És una cosa que no em passa pel cap, el país és una cosa massa abstracta. Si em dius la llengua, com deia Pessoa, encara.

Fa pocs dies un dels meus germans, que va sovint a Madrid, em va escriure: "... he vist tan clar com el cristall claríssim que allò és una gran ciutat i això de barna un poblet de merda". Bé, la meva opinió (ara no tinc cap dada) és que els anys de govern de dretes a Espanya van ser els que van fer que la diferència entre Madrid i Barcelona creixés tant. I era un govern que tenia el suport del partit nacionalista català més gran.

No tinc clar que els que s'omplen la boca parlant de com estimen Catalunya siguin els qui més ajuden el país, o la llengua. No hi ha una relació directa. Conec gent que no és gens nacionalista que, per motius que no són l'amor a la pàtria, fa classes de català per a immigrants... És complicat!

:)

優次 (Yuji) said...

Sempre que em demanen "d'on ets?" i contesto "de São Paulo", és sempre la mateixa reacció de "Ah, sí?". No ho sé bé, no és una cosa tan intensa com abans, però sí que n'hi ha encara una miqueta.

***

...no entenc res del teu país perquè jo visc a un país -artificialment, perdona- monolingüe xD

***

L'altre dia m'he fixat d'una cosa que no m'hi havia fixat. Conec un noi de Melilla, i saps no?, Melilla és complicada... El que fa gràcia és la manera com s'omple la boca per parlar malament de la gent d'allà (beduïns? ciutadans de segona?), i com que és espanyol i se n'enorgulleix. És així des que ens vam conèixer. Em pregunto si part d'aquest nacionalisme no ve del prejudici que potser hagués patit de gent de la península? Nacionalisme crida a més nacionalisme?

優次 (Yuji) said...

No són beduïns... Això és una altra cosa! Crec que es diuen bereberes o alguna cosa per l'estil...

Roger said...

Això és el que es diu, que els nacionalismes s'alimenten mútuament. Hi ha qui diu que es "necessiten" mútuament.

Aquest noi, no ho sé! Més que haver patit prejudicis a la península, potser el seu nacionalisme té a veure amb el fet d'estar envoltat de marroquins. No he estat mai a Ceuta ni a Melilla, però segur que qui viu allà i no és espanyol és tractat com el que tu dius, un ciutadà de segona... A no ser que sigui un marroquí ric! :(

uri said...

it's true, els extrems es toquen i els nacionalismes es necessiten i s'alimenten entre sí...

la prova la tenim aquí (i a molts altres llocs, per desgràcia), que com més radical es torna el nacionalisme espanyol, més puja el nacionalisme radical català i viceversa és, com ho diria jo, com una simbiosi (jejeje, m'agrada aquesta paraula)... l'un, sense l'altre, nonsense.

i, també és cert, moltes vegades els que més parlen d'amor al seu país són els que més mal li fan (avi dixit)

però quan no ha sigut així?

uri

Roger said...

L'avi va dir això? :o)

Collons, collons... :)