Tuesday, November 10, 2009

Indignação, de Philip Roth

Estou chegando ao final de Indignação, o último romance (ou penúltimo, não sei, porque ele escreve sem parar) de Philip Roth. Foi uma recomendação do amigo Pedro. Eu estava com receio, não queria ler mais uma história parecida às de The Human Stain ou Everyman (não li nenhum dos romances anteriores, como Portnoy's Complaint), inevitavelmente protagonizada por um velho e amargurado professor universitário que fica com a jovem mais linda do campus - com uma ou várias cenas de sexo no escritório. Porém o Pedro me disse que não era o caso: o romance se passava em um campus, mas o narrador era um jovem estudante recém-chegado, que não se adaptava aos colegas e trocava três vezes de quarto em um mês; um pouco parecido, disse, com O apanhador no campo de centeio. Encontrei semelhanças, sim, com O apanhador..., e também com o Retrato do artista quando jovem, se bem que o protagonista de Indignação, Markus Messner, não é tão revoltado como Holden Caulfield (ou não tão profundamente revoltado), nem é um gênio como Stephen Dedalus: é "só" um "aluno nota 10" (ele usa essas palavras para se proteger).

O narrador-protagonista descreve tudo, em todo detalhe, com toda a complexidade, usando sempre as palavras exatas: o entorno (desde o açougue kosher do pai até o dormitório universitário), as relações, as emoções, as falas (há grandes diálogos no texto). Isso, que facilita a leitura, contradiz alguns teóricos da literatura, àqueles segundo os quais contar tudo seria ruim porque não deixaria espaço para o leitor pensar. Mas há muitas maneiras de fazer o leitor pensar. E, aqui, o leitor talvez não deva preencher espaços vazios na história, mas é levado a pensar, e muito, sobre o porquê dos fatos narrados poderem acontecer (acontecerem, de fato).

Há muito eu não lia um livro tão violento, de uma violência verbal, psicológica, soterrada, feita de chantagens, hipocrisias e também pura crueldade; de pais para filhos, de professores para alunos, de colegas para colegas; e também (sobre tudo?) com essa violência sem agente definido, a exercida pela sociedade, a "tradição", a "regra"*. Depois de ler um trecho determinado, já perto do final, tive que parar, sair da cama e fumar um cigarro; não pelo vício :), senão porque aquilo que estava acontecendo na história era duro demais. Romances como este fazem falta para mostrar vivamente (e, nisso, os livros de Salinger e Joyce são também grandiosos exemplos) a revolta contra a sociedade que a gente criou.

No meio da história, o narrador revela um fato importante. Essa é a única falha que até agora encontrei: é esquisito ter esse dado tão cedo. Mas, quem sabe, as últimas páginas dêem uma lógica a isso. Afinal de contas, trata-se do monstro Philip Roth.

E achei a tradução, de Jorio Dauster, muito boa. O português flui, nenhuma frase parece estranha ou calco do inglês.


*Um trechinho: (...) eu próprio havia sido tragado pela insipidez não apenas dos costumes da Universidade de Winesburg, mas da retidão que tiranizava minha vida, a retidão sufocante que, eu estava prestes a concluir, levara Olivia à loucura. Mamãe, não examine a família para conhecer a causa - examine o que o mundo convencional não considera permissível! Olhe para mim, tão pateticamente conformista ao chegar aqui a ponto de não poder confiar numa garota só porque ela chupou meu pau!




Ward Sutton

6 comments:

R. Luiz said...

"Mamãe, não examine a família para conhecer a causa - examine o que o mundo convencional não considera permissível!" Adorei... me parece uma bom livro, boa leitura.

R.

maritrini said...

emprestamelo!

Roger said...

Sí, sho sha te lo shevo ashí. (Mirá, el porteño se parese al chino!)

Você ia gostar, Rô! Pega aí na LDM! :)

Leo Wittmann said...

Ainda não li nenhum livro do Philip Roth, mas penso em começar por esse. Parece interessante.

E continua a postar os capítulos do teu romance, estou acompanhando todos!

Anonymous said...

Ótimo texto. Me identifiquei com a tua visão do livro. Abraço!

Roger said...

Eu achei muito interessante, e acho que tu vai gostar, Leo.

Depois comento teu conto por e-mail (gostei muito).


Ótima dica, Pedro!